quarta-feira, 21 de março de 2007

Histórias da roça

Fim de tarde na roça. Após o pôr-do-sol, o azul escuro da noite se mistura com os últimos raios de sol, formando aquela camada laranja-escura. Os pássaros emitem os seus últimos cantos e preparam-se para dormir. Quem ainda permanece acordada e cantando é a cigarra. Foi-se mais um dia, animado e feliz, como os dias na roça são, para um menino criado na cidade. Andar à cavalo, brincar com cachorros, passear pela roça, jogar bola... são tantos os prazeres de se estar no campo, totalmente desplugado da cidade. Fim de tarde, casa escura: é hora de acender os candeeiros. Candeeiros acesos, e a casa já fica com clima de noite. E o café? E a janta? Tem que acender o fogâo à lenha! E menino já gosta de brincar com fogo... "Deixa isso aí, menino! Quer se queimar?" Mas, e o banho? Tomar banho na fonte é uma maravilha! Os pudores da cidade acabam nos preocupando, às vezes, mas é tão bom ficar niu em contato com a natureza! Porém, tomar banho na fonte depois do fim de tarde é cruel: o frio não perdoa! E puxa a àgua do balde, e toma banho, e se esfrega, e se treme dos pés à cabeça, e corre para se enxugar logo... Banho tomado, volta para casa. A noite já caiu, e o caminho está totalmente escuro. Um breu enorme! É muito bom andar no escuro. E o céu na roça é muito mais bonito, tem muito mais estrelas! Ao chegar em casa, cheirinho da fumaça e da janta cheirosa! "Mãe, quero jantar!" E na casa, aquela festa familiar que só a roça proporciona!

domingo, 4 de março de 2007

Todo sertanejo tem um fascínio pelo mar

Pois nas abas do chapéu queimado pelo sol e surrado pelo tempo, vão e vêm gotículas de lembranças. Os olhos irradiam uma nuvem espessa de felicidade e paz. Tira o chapéu e cumprimenta o mar. Não banha-se e benze-se, inicialmente, pois este costume não é de seu conhecimento. Prefere cumprimentar aquele “açudão” agitado, que mais se assemelha a um boi enfurecido. Tempos de criança reaparecem em questão de alguns segundos na sua mente, quando brinca, inocentemente, com a água. Chuta, corre, cai e mergulha... Da pele seca castigada pelo sol sertanejo, ressurge a camada encharcada e salina, brilhante como o luar sertanejo. E as ondas vêm e vão, assim como a seca, assim como a plantação. E, enquanto brinca com a água, momentos peculiares são apagados, como por exemplo, os dias em que teve que aboiar gados secos e quase mortos, pelo chão tórrido do sertão, à procura de uma poça de lama e de um resto do subnitrato do pó de um capim seco. E os gados mugiam tristes, pareciam lamentar insistentemente pela vida. Mas, ao ver as algas verdes, lembrou da época em que a chuva abençoava o seu querido pedaço de chão, trazendo com ela, as boas novas da esperança. Mas, por que será que todo sertanejo tem um fascínio pelo mar? Talvez pelo fato de o mar trazer com ele vestígios de um mundo inimaginável e ininteligível, algo semelhante ao paraíso. Mas acredito mesmo que seja pelo fato de o oceano ser sinônimo de paz. Azul-esverdeado ou verde-azulado... lembra céu num dia de sol... lembra paz! Movimento intermitente de ondas, também lembra paz! Porque a paz não é a constância e sim a inconstância dinâmica da vida! E, assim, o sertanejo volta para o seu sertão, local de lembranças infindas, com a lembrança inesquecível de um dia poder ter entregado a sua alma ao mar.